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BRASÍLIA UTOPIA LÍRICA | VICENTE DE MELLO
De 29 de Novembro à 16 de Fevereiro.
Concreto sentimental
Concreto sentimental
Christian Carvalho Cruz
A obra do fotógrafo Vicente de Mello tem uma origem incomum – e outra bastante comum. “Niteroiense nascido em São Paulo”, 46 anos e filho de um “amador profissional” em fotografia, desde cedo ele dividiu com o pai o manejo de um hit fotográfico dos anos 1970, a camerazinha Olympus Trip 35. Essa, a origem comum. Mas foi na facul- dade de publicidade que a brincadeira ficou séria. E incomum. Estagiário no Museu de Arte Moderna do Rio, Mello, na falta de outro, passou a fotografar as exposições e obras do acervo. Conheceu pintores, escultores, que o chamavam para registrar seus trabalhos no ateliê.
“Acabei me tornando um grande reprodutor de obras de arte”, ele diz. “É um tipo de fotografia que exige demais do fotógrafo. Não é tão simples capturar fielmente as cores de um quadro, ou descobrir que ângulo e luz favorecem uma escultura.” São de Mello, por exemplo, todas as fotografias dos trabalhos da escultora Maria Martins no belo livro Maria (Cosac Naify, 2010).
Hoje ele faz reproduções ocasional- mente. Dedica-se mais a sua consistente fotografia autoral, um tanto provocadora (como seu Bestiário de animais domésticos), outro tanto inovadora (sua Galáctica de lustres) e sempre tecnicamente primorosa. Uma obra presente em coleções como a da Fundação Cartier para a Arte Contemporânea e a da Maison Européenne de la Photographie e que traz muito do que ele andou “bebendo” nos tempos do MAM e naquelas noites viradas em ateliês de artistas como Adriana Varejão e Márcia X.
Aqui Mello apresenta uma série de 2012, Brasília Utopia Lírica, em exposição no Paço Imperial do Rio até domingo, 16.
A gente olha essas fotos e sabe que é Brasília. Mas sente um estranhamento...
É uma das propostas. Eu chamo de “transvisão”. Uma conversa entre arquitetura e fotografia capaz de resgatar a cidade de sua exaustão visual. Os grandes mestres modernistas – Marcel Gautherot, José Medeiros, Thomas Farkas, Peter Scheier – fotografaram brilhantemente Brasília e de certa forma a obra deles está na cabeça das pessoas. Como eles, usei uma Rolleiflex dos anos 1950 e filme preto e branco. Mas acho que as semelhanças param aí, porque não faço uma atualização do trabalho deles, embora tenha o olhar treinado por eles. Adoro Geraldo de Barros.
Ao contrário de uma atualização,
parece que um fotógrafo dos anos 2000 viajou no tempo levando seu olhar contempo- râneo para fotografar com aqueles caras.
Existe no meu trabalho um traço fotográfico comum que é ir além de um pensamento mais fácil, refazer possibilidades, narrar de outro jeito. Na exposição no Rio o que mais ouço das pessoas são coisas assim: “Péra aí, mas que parte de Brasília é essa?! Nunca vi isso!”.
E como você conseguiu isso?
Frequentando muito esses lugares, pesquisando todas as possibilidades. Perguntava para as pessoas: “Que horas o sol bate nesta parte do prédio?”. Anotava tudo num caderninho e voltava depois. No final de um dia de trabalho eu parecia um candango. Tinha a roupa suja, empoeirada, porque deitava no chão e me enfiava nos lugares mais improváveis em busca do que queria. Na foto Saturnoscar, por exemplo. Eu já tinha ido uma porção de vezes ao Museu Nacional da República e não conseguia enxergar uma boa foto ali. Um dia, de dentro do carro eu enxerguei! Pedi pro motorista parar, desci e fiz a foto. Era a luz e o ângulo que eu estava procurando.
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